Caso sério ©
Categoria: Música

Há quem costume ser acometido de delírios de grandeza. Eu sou acometido de delírios de miudeza. É que vivo pequenamente – embora sonhe grande. A vida que mais me interessa é a vida miúda, ao rés-do-chão. Celebrar o miúdo – eis meu ofício. Gosto mesmo é de constelar com a luz das palavras tudo que pareça destituído de brilho. Será que consigo? Está certíssima a jornalista Eliane Brum quando diz: “Não existem vidas comuns. Existem olhos domesticados”. O meu olhar amoroso para a vida menor vive me premiando com belezas baldias escondidas nas dobras do quase invisível. E tudo porque, acho, não tenho um olhar domesticado. Não perdi a capacidade de assombro, de espanto diante do belo gratuito e de tudo o mais que é da vida. Minha adesão é total a tudo que chamamos distraidamente de vida e cujo arco generoso vai do sublime ao grotesco. Acho que tenho mesmo um caso sério de amor com a vida. Mas não conte pra ninguém. É segredo!

 

© Nota de canapé: Sucesso da vovó roqueira Rita Lee.


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    Alexandra
    3 de julho de 2011

    Especial Tarlei,

    adorei a expressão “delírios de miudeza”, a vida no rés-do-chão, as “belezas baldias escondidas nas dobras do quase invisível”, a possibilidade de “constelar com a luz das palavras…”. Seu texto é belíssimo, e ainda por cima consegue me traduzir (que atrevimento o meu)!

    Um dia me encantei com o título de um livro: Tratado Geral das Grandezas do Ínfimo ( Manoel de Barros). Nunca o li, mas reconheci-o no seu texto. Isso mesmo, um livro inteirinho, que é possível adivinhar nas miudezas da sua escrita. Continue celebrando o ínfimo!

    Meu abraço amigo,
    Alexandra


    Tarlei
    4 de julho de 2011

    Querida Alexandra,
    Você está sempre constelando com a luz das suas generosas palavras as miudezas que disponho na tela. Muito obrigado! E já que você falou em Manoel de Barros, poeta amado, anuncio que breve pousará aqui um post com o título “Concerto a céu aberto para solos de ave”. Gosto dos títulos do Manoel. “Tratado geral das grandezas do ínfimo” é uma maravilha. E o primeiro livro que ele publicou teve esse título: “Poemas concebidos sem pecado”. Ah, estou relendo o seu “Minha avó botou um ovo”. Que delícia de releitura!
    Abraços,
    Tarlei


    Angela Delgado
    12 de agosto de 2012

    Com esse seu escrito, você me lembrou meu tio de “Ópera do Poeta e do Bárbaro”, no trecho em que estando à procura de Gênios, deparam com um rapaz de terno cinza. Alertado para que o seguissem, pois era um gênio, protestou que ele era um pobre garçom, apenas um homem a mais. E ele escuta que não existe um homem a mais, almas comuns.
    ” Que importa onde a vida o jogou, se sua alma é Gênio?
    Que importa seu restaurante, se as almas nunca são garçons? …”
    Você tem que ler esse livro!


    Tarlei
    12 de agosto de 2012

    Ângela,
    costumo dizer que sou um leitor crônico cronicamente sem tempo para ler tudo que quero, desejo e preciso…
    Fiquei curioso desse seu tio.
    Abs,
    Tarlei






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