29
nov/13
Eu apenas queria que você soubesse ©
Eu apenas queria que você soubesse…
Que eu não sei o que escrever hoje.
Que eu vou escrever qualquer coisa – como se não fosse assim quase todo dia.
Que eu fico pasmo com a extensão da minha lavoura de abobrinhas.
Que eu estou vergado de obrigações.
Que eu quero é não fazer nada.
Que eu preciso de uma casa no campo.
Que eu “vou-me embora pra Pasárgada”.
Que “eu quase que de nada não sei, mas desconfio de muita coisa”.
Que “eu tô estudando pra saber ignorar”.
Que a vida é uma comédia.
Que o buraco é mais embaixo.
Que “tudo vale a pena quando a alma não é pequena”.
Que “não se encontra a manhã a não ser pelo caminho da noite”.
Que “nem tudo que conta, pode ser contado”.
Que “nem tudo que pode ser contado, conta”.
Que dias melhores virão.
Que “a alegria é a prova dos nove”.
Que o que não tem remédio, remediado está.
Que “o passado é uma roupa que não nos serve mais”.
Que “o sábado é uma ilusão” e é para essa doce ilusão que desejo ir sem demora.
Que eu desejo um fim de semana daqueles – para mim, para você, para todos.
© Nota de canapé: Canção do Gonzaguinha.
26
nov/13
Como viver
Sarah Bakewell escreveu uma excelente biografia de Montaigne, o grande ensaísta francês, estruturada na forma de uma pergunta (Como viver?) e vinte tentativas de resposta. Cada tentativa de resposta tem como guia os próprios ensaios de Montaigne. Reproduzo as tentativas de resposta sumarizadas no sumário (passe a redundância), não resistindo à tentação de uns comentários (entre parênteses).
1) Não se preocupe com a morte (“A morte não é feia / Nem bonita / A morte é onde a vida / Põe um ponto / Um ponto de partida” – Marina Colasanti);
2) Preste atenção (Eu tento. Diria que sou um distraído atento. Ficar muito atento ao que me interessa impõe uma distração enorme para tudo o mais);
3) Trate de nascer (Sujeitos à morte interina do sono, nascemos todos os dias);
4) Leia muita, esqueça tudo que lê e raciocine com lentidão (Isso eu pratico à perfeição);
5) Sobreviva ao amor e às perdas (Ligação direta com o budismo e a impermanência de tudo);
6) Recorra a pequenos truques (A minha cara);
7) Questione tudo (Sou um questionador silencioso. Questiono para dentro);
8 ) Tenha um compartimento privado nos fundos da loja (“Ninguém sabe quem eu sou quando rumino” – Machado);
9) Seja sociável: viva com os outros (Adoro gente, mas sou menos sociável do que desejaria);
10) Desperte do sono do hábito (Acredito que a leitura, uma profunda vivência de alteridade, tenha esse poder);
11) Viva com temperança (Em matéria de moderação, exagerado; em matéria de exagero, moderado. Perfeito, não?);
12) Preserve sua humanidade (“A raça humana é a ferida acesa / Uma beleza, uma podridão” – Gilberto Gil);
13) Faça algo que ninguém nunca tenha feito (Tento não fazer nada, algo completamente inédito);
14) Conheça o mundo (O mundo que mais me interessa conhecer é o que está refletido no espelho da palavra escrita);
15) Faça um bom trabalho, mas nem tão bom assim (Dispensa comentários);
16) Filosofe só por acaso (Penso, logo eis isto);
17) Reflita sobre tudo; não se arrependa de nada (Muito difícil viver sem algum tipo de arrependimento);
18) Abra mão do controle (Tendo freqüentado a escola de minha mãe, tenho muito a desaprender nesse quesito);
19) Seja comum e imperfeito (De tão imperfeito, chego a ser incomum na imperfeição);
20) Deixe a vida responder por si mesma (Viver é a única resposta).